ARTIGO

Bauxita, Bruxelas, Brasília

01/12/2020

 

Por Milton Rego *

Em setembro, a Comissão Europeia publicou um documento que passou despercebido no Brasil: “Resiliência em matérias-primas essenciais: o caminho a seguir para mais segurança e sustentabilidade” (eis a versão em português: https://bit.ly/39gCF8G ).

O título com cara de tese acadêmica traz uma acurada análise das matérias-primas consideradas de maior importância pela Europa. Essa avaliação é feita a cada três anos, desde 2011. Seu objetivo é identificar e garantir a médio e a longo prazos, para as nações do bloco, acesso diversificado aos mercados globais dos insumos considerados críticos ou essenciais. 

A pandemia trouxe a preocupação com o abastecimento das cadeias de globais de suprimento para diversos setores industriais. Portanto, o levantamento da Comissão Europeia se propõe a garantir que não ocorra falta de materiais estratégicos em uma situação de exceção.

E o que os europeus entendem como matérias primas “essenciais” ou “estratégicas”? São, especialmente, aquelas ligadas à economia circular para os ecossistemas industriais que serão responsáveis por alcançar a meta de neutralidade climática até 2050. E, nesse ponto, a busca é por matérias-primas resilientes, ou seja, capazes de serem reutilizadas diversas vezes. 

A lista

Além de estarem ligadas à busca de uma economia mais verde, dois parâmetros foram utilizados para construir a lista de matérias-primas: a sua importância econômica e o risco de escassez. Compõem o levantamento 30 materiais. A eleição também levou em conta alguns fatores.

Um deles é o crescimento exponencial da eletrificação veicular. Outro é o aquecimento global e a maior demanda por energia para alimentar geradores e sistemas de refrigeração. As demandas do setor de defesa e espaço também foram consideradas, uma vez que a Aliança Militar do Atlântico Norte (Otan), por exemplo, vai precisar se virar cada vez mais sem ajuda dos EUA. E, finalmente, as chamadas “tecnologias hipocarbônicas” entraram na conta. Elas visam a diminuição e neutralização do carbono e têm a ver com o compromisso europeu de zerar as emissões até 2050.

Esse conjunto de variáveis explica a inclusão da bauxita – utilizada na fabricação do alumínio --, pela primeira vez na lista de matérias-primas estratégicas.

Veículos elétricos usam muito alumínio. Seu emprego ajuda a diminuir o peso acrescentado pelas baterias. Além disso, o material dissipa o calor. O alumínio compõe a estrutura de coletores solares e peças de turbinas eólicas. Aeronaves, sejam aviões ou veículos projetados para voo especial, levam alumínio.

Dos metais base como aço, níquel, zinco, cobre, o alumínio é, de longe, o mais reciclado. Ele pode ser reaproveitado infinitamente sem jamais perder as suas propriedades. O Instituto Internacional do Alumínio estima que ¾ do total do metal produzido no mundo nos últimos 100 anos ainda está em uso. 

Bruxelas pensa assim. E Brasília?

A União Europeia está à frente no mundo quando o assunto é sustentabilidade, especialmente porque esse é um valor apoiado pelos seus cidadãos. Precisamos aprender com eles. A Europa entende a sustentabilidade como item fundamental para a competitividade do bloco. E está trabalhando para que isso se reflita no preço dos seus produtos.

A leitura do estudo da Comissão Europeia deveria ser obrigatória em Brasília. Afinal, temos a quarta maior reserva de bauxita do mundo e sabemos minerá-la de modo sustentável e competitivo. É preciso entender a importância da bauxita na economia nacional, promovendo o fortalecimento da cadeia do alumínio e a agregação de valor dentro do país. Entender o papel do alumínio como habilitador de uma economia verde é fundamental.


Milton Rego é Presidente-executivo da Associação Brasileira do Alumínio (ABAL)