“Como a sociedade pode se organizar para a mineração artesanal legal e correta?”

11/11/2022
Participaram da mesa-redonda Gilson Camboim, Pedro Eugênio, Caio Mario Trivellato Seabra Jr, Antônio João Paes de Barros, e como moderador Fernando Gabriel Araújo.

 

O segundo dia do 7º Mineração &X Comunidades, realizado no dia 9 de novembro, começou com o Painel “Como a sociedade pode se organizar para a mineração artesanal legal e correta?”. Participaram da mesa-redonda Gilson Camboim, presidente da FECOMIN/MT, Pedro Eugênio, diretor de Operações da Fênix Participações, Caio Mario Trivellato Seabra Jr, Superintendente de Ordenamento Territorial e Disponibilidade de Áreas da Agência Nacional de Mineração (ANM), Antônio João Paes de Barros, geólogo da METAMAT, tendo como moderador Fernando Gabriel Araújo, diretor do Departamento de Pesquisa em Engenharia e Educação Continuada (DEPEC/Gorceix).

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O primeiro participante, Gilson Camboim, começou o debate falando sobre a extração legal da mineração industrial, atividades garimpeiras e a mineração de pequeno porte. Citou como exemplo o trabalho que desenvolve junto às cooperativas de garimpeiros. “Esses membros da cooperativa são, em geral, a população local da região e eles traze soluções, orientações técnicas para fortalecer a atividade. Nesse sentido, as responsabilidades ambientais e demais compromissos são assumidos junto às prefeituras. As comunidades com esse público inserido entendem a importância do setor mineral e a consciência financeira para o público que atua no segmento, mas não possui um grau de instrução para boa gestão dos recursos”. 

Para Camboim, este trabalho tem sido ampliado por meio do cooperativismo de crédito, para inserir a população local. “O cooperativismo ajuda a inserir e envolver a população local e a atividade está ligada ao meio ambiente, seja atuando independentemente ou em parceria com o poder público por meio da distribuição de mudas junto à comunidade local para desenvolver a responsabilidade ambiental”. Ele afirmou que o cooperativismo pratica o ESG e o ODS há tempos junto às comunidades, acrescentando que, no passado, algumas empresas minerais tinham receio da pequena mineração, por causa da questão do garimpo. Mas, com o passar do tempo, houve mudança de percepção e descobriu-se que uma mineração completa a outra. “A mineração artesanal e a de pequena escala envolvem a sociedade que aos poucos começa a se relacionar com o projeto”. 

Na sequência, Antônio João, da METAMAT, disse que a empresa se baseia no trabalho de geologia para resolver problemas de conflitos entre garimpeiros e mineradoras, que envolvem ações do Ministério Público pelo domínio do subsolo. “O Mato Grosso tem as províncias auríferas de Alta Floresta, Guaporé e da Baixada Cuiabana. Essas províncias são compostas por migrantes da Bahia e Minas Gerais”. 

Sobre o arcabouço legal do regime de Permissão de Lavra Garimpeira (PLG), Antônio João disse que antes da Constituição de 1988 havia o regime de matrícula, uma carteira de porte individual emitida por um sindicato de garimpeiros. Mas o artigo 21 da Constituição mudou este cenário e a União passou a estabelecer as áreas e as condições para o exercício da atividade de garimpo, de forma associativa. E o artigo 174 estabelece que as cooperativas criadas terão prioridades de autorização nas áreas de pesquisa e lavra onde estão atuando, como nas reservas garimpeiras, o que favorece a atividade. “O regime de PLG abrange atividades garimpeiras cuja práxis exploratória é fincada em três pilares: 1) aproveitamento imediato do jazimento, independente de pesquisa prévia; 2) Aproveitamento das substâncias minerais no interior das áreas estabelecidas para tal finalidade e 3) estabelece os bens minerais e deixa outras formas ao enquadramento da ANM”. Mas na realidade, a maior parte dos garimpos de ouro e cassiterita na Amazônia são ilegais ou encontram-se fora das áreas estabelecidas. “Fica difícil seguir uma lei, onde o minerador fica como um ”clandestino”. 

Antonio João cita como casos de sucesso de ordenamento e regularização no Mato Grosso a reserva garimpeira de Peixoto Azevedo, onde houve enfrentamentos e riscos ao ambiente de produção e negócios, mas a METAMAT, em parceria da ANM, assinou um Termo de Conciliação que permite aos garimpeiros organizar as cooperativas para obter o subsolo. Outra iniciativa é a 6ª rodada do edital para regime de PLG para a reserva garimpeira do Cabeça. “As cooperativas de garimpeiros são geridas por aqueles que têm maior conhecimento empresarial, e a regularização dessas áreas requer um nível de capitalização e investimento para obter a concessão do subsolo, centralizada na ANM e licenciamento ambiental, processo oneroso e lento. Outro problema é a falta de políticas públicas para comunidades garimpeiras tradicionais, de forma similar ao que ocorre com as comunidades extrativistas, quilombolas etc com respeito a espaços geográficos, direitos, cultura, valores e identidade.

Caio Seabra, da ANM, disse que o ordenamento do território é o principal desafio para União, estados e municípios, porque é algo que provoca a fonte do problema. “Uma política pública malfeita pode prejudicar todo o futuro de um trabalho. Existe exploração garimpeira ilegal e a ANM busca regularizar a situação de todos, mas não podemos outorgar títulos para qualquer um”. 

Além desse caos de ordenamento territorial, é preciso tornar a mineração ilegal correta, segundo ele, para que a haja possibilidade de explorar uma área dentro da lei. As cooperativas são de grande importância para legitimação e para que se alcance uma solução. É uma possibilidade para evoluir no relacionamento entre comunidade, empresa e cooperativas rumo ao mesmo objetivo. “Muitas das cooperativas não têm assistência técnica devida e é feito um trabalho para que elas evoluam”. 

Pedro Eugênio, da Fênix, comentou sobre a importância da responsabilidade da iniciativa privada para a mineração artesanal. “Nós atuamos na cadeia produtiva da pequena e média mineração do minério de ouro e praticamos o mercado de comercialização do metal no Brasil. Com uma experiência no exterior, nós vimos que teríamos que aplicar práticas internacionais que seguem regras rígidas e sérias, alinhadas com o meio ambiente e exploração mineral, para poder acessar o mercado do País”. 

O objetivo do debate é uma mineração artesanal e combate à mineração ilegal e uma autorregulação da cadeia produtiva é importante, pois a atual é fraca, arcaica e o mercado não se apoia mais nisso. “Nas políticas internas da Fênix, vamos além do que a lei impõe, com a atuação em frentes de desenvolvimento dessas diretrizes para uma mineração sustentável. Nos inspiramos também no mercado de câmbio, que tem várias diretrizes positivas que em termos de regulação é excepcional. As discussões envolvem tecnologias, novas possibilidades de mercado e qual é o motivo para não trazer isso para o ouro?”. 

Manual de Relacionamento com Comunidades 

Na sequência houve a apresentação do “Manual de Relacionamento com Comunidades em projetos de mineração”, com Keyty Silva, cientista socioambiental e coordenadora de Projetos da Integratio e Paulo Misk, presidente do Sindimiba – Mineração na Bahia, conselheiro da CNI/Comin, ABPM e IBRAM. 

Paulo Misk comentou, em mensagem de vídeo, que o Manual foi elaborado pela Integratio e pela Confederação Nacional da Indústria (CNI) para ser um guia prático para orientar pequenas, médias e grandes empresas para melhorar o relacionamento com as comunidades. “O objetivo é que todos possam participar e evoluir em todas as comunidades inseridas. As minerações têm responsabilidade social muito forte”. Keyty Silva complementou a apresentação dizendo que o manual teve um processo participativo com as empresas com diversas reuniões para levantamento das expectativas e ações já realizadas. “É um documento orientador e complementador para que as empresas não fiquem fora do contexto do território, mas que integre, sendo um agente interno”. 

“O ciclo de vida (ou o fechamento eminente) das minerações e as alternativas de desenvolvimento econômico”

O segundo painel foi “O ciclo de vida das minerações e as alternativas de desenvolvimento econômico”, que contou com Alexandre Mello, diretor de Relações com Associados e Municípios - IBRAM, Marco Antonio Lage, prefeito de Itabira, Eduardo Leão, gerente de Sustentabilidade da G Mining Ventures, Ronaldo Souza, diretor de RH, Administração e Relacionamento com Comunidades da Largo, João Cruz Reis Filho, diretor técnico do Sebrae e moderação de Virgínia Ciminelli, professora da UFMG e conselheira da Brasil Mineral. 

O prefeito Marco Antonio Lage disse que o desafio do momento é buscar a diversificação econômica como elemento de qualidade de vida, como garantia do legado da mineração. “Para isso trabalhamos em duas frentes importantes em Itabira, com a utilização dos recursos públicos na garantia da qualidade de vida e na preparação do ambiente para receber um novo ciclo econômico. Trabalhamos em parceria com o Sebrae para uma reconversão produtiva pós-ciclo mineral”. Lage disse que a mineração tem sido debatida mais abertamente, como segurança de barragens, mas o fundamental para o momento é a reconversão produtiva. A outra frente é um trabalho de cogestão com a própria Vale, com planejamento estratégico, investimentos estruturantes e com a participação da sociedade civil estruturante. A Vale contratou uma empresa internacional com 15 Grupos de Trabalho e 62 projetos estruturantes para ver como será Itabira daqui a 20 anos, no pós-mineração de um território minerado. 

Na sequência, Eduardo Leão, da G Mining, abordou a APA do Tapajós, onde há uma reserva garimpeira e onde não há apenas o garimpo, mas atividade mineradora. “Há um descompasso no fechamento da mina e na diversificação econômica do território com 100 mil garimpeiros. Não há boi, não tem agricultura familiar, então, como ensinar uma pessoa a fazer diversificação econômica se ela só sabe garimpar há 50 ou 60 anos?”. 

O garimpo é digno, segundo ele, por estar em uma reserva garimpeira, e quer se regularizar. Há uma ideia de criar, em parceria com o ICMBio, um plano de manejo com o garimpo. Para Leão, o impacto provocado pelo garimpo é pequeno e pode ser revertido. “Há garimpo com viveiros de mudas, mas os ilegais não possuem PLG e não conseguem ter uma licença com ICMBio”. Alexandre Mello, do IBRAM, comentou dois assuntos: o primeiro é o fechamento de mina, desde a sua concepção até como ficará a lavra após a atividade, o que aquele território vai traçar para o futuro, e a diversificação econômica para a comunidade ser beneficiada após o término da atividade minerária no município. Ele informou que “o IBRAM tem dois projetos de diversificação econômica - o primeiro convênio de reconversão produtiva em parceria com a AMIG, ICLEI (foco na agenda climática), Sebrae, FIEMG, BDMG entre outros atores, e o segundo, de diversificação econômica, especificamente com a AMIG, para ampliar a atuação em outros municípios. Empresa, poder público e comunidade devem trabalhar em conjunto, e caso um destes falhe, o projeto é prejudicado”. 

No dia 17 de novembro, Mello comentou que haverá o lançamento do PROX, um aplicativo com várias informações sobre barragens, eventos extremos, pluviosidade, que proporcionará maior informação via celular para a comunidade, inicialmente em Minas Gerais. É uma parceria com a CEMIG e Defesa Social de Minas Gerais e alguns municípios. Por fim, Mello abordou a Licença Social, onde o IBRAM tem todo um processo regularizado em que as empresas precisam atuar e, em alguns anos, vamos chegar a uma regulamentação geral e um projeto de diversificação econômica irá aderir à própria Licença Social na região. 

Ronaldo Souza, da Largo, explicou como se estabelece o relacionamento com a comunidade durante todo o projeto, desde o início até o fechamento da mina. Em Maracás, temos seis comunidades no entorno da mina e devemos respeitá-los, pois já estavam lá quando chegamos para o desenvolvimento do empreendimento. “Quando se inicia uma conversa sobre um projeto mineral, geram-se expectativas com o que pode ser gerado com o projeto. A Largo dialoga e busca entender as expectativas dos territórios, para formar e capacitar lideranças comunitárias e até onde podemos ir. É uma relação construída em conjunto na geração de emprego e renda para que a comunidade possa ter o mesmo padrão mesmo depois do fechamento da mina”. Ele disse que a Largo atua na área ambiental para minimizar ao máximo os impactos junto das comunidades, além de esporte, cultura e lazer. O ponto mais evidente é a questão de emprego e renda. “Temos uma parceria com o SESI/Senai em um programa para formar as pessoas para o mercado de trabalho, além de Maracás. O SESI/Senai realizou pesquisa e disse que 20% já atuam em alguma área em que se formaram no SESI/Senai. Isto tudo gera um ciclo de crescimento. Todos nós queremos as mesmas coisas temos que dar as mãos para conseguir o melhor resultado”. 

João Cruz, do Sebrae-MG, disse que tem um trabalho de desenvolvimento econômico local em parceria com prefeituras para melhorar o ambiente de negócios no estado. Nesse contexto, a prefeitura simplifica os pequenos empreendimentos, de ser amigável, e nos fez entender as ações para ajudar no desenvolvimento. Para ele, não tem como ignorar a importância da mineração para Minas Gerais. Segundo levantamento que nós realizamos, onze municípios têm área maior que onze municípios que são dependentes economicamente da mineração. “Os territórios têm vocações econômicas novas, como o projeto de reconversão produtiva. Ele tem efeito inédito que pode juntar diferentes atores, como IBRAM, UFMG, Governo do Estado e empresas para construir cada um desses territórios dependentes da mineração. Em menos de três anos temos caminhado bem em alguns territórios, como em Itabira. Podem-se potencializar vocações econômicas e diversificar a cadeia minerária nos locais. O principal gargalo está na Governança para fazer a reconversão, que fica dificultado se a comunidade não fizer parte do combinado, se não tiver engajamento. A prefeitura de Itabira abraçou o projeto de governança local coletivamente com participação ativa da comunidade”. 


A 7ª edição do Mineração&XComunidades é uma realização da revista Brasil Mineral e tem patrocínio Ouro da Kinross, CBA, Appian Capital Brazil, BAMIN e ERO Brasil, patrocínio Prata da Largo, Bemisa, Anglo American e Hochschild e patrocínio Bronze, da Buritirama Mineração, Galvani, Aura e Potássio do Brasil, além da coordenação técnica e apoio da Integratio.