“A fiscalização da aplicação da CFEM para sua correta destinação pelos municípios tem funcionado?”

11/11/2022
Participaram Maria Green, do CETEM, Sérgio Leão, do Tribunal de Contas do Município do estado do Pará (TCM Pará) e Rogério Moreira, Consultor Jurídico da AMIG. 

 

Na parte da tarde do 7º Mineração&XComunidades, do dia 9 de novembro, houve o Painel “A fiscalização da aplicação da CFEM para sua correta destinação pelos municípios tem funcionado?” com a moderação da conselheira da Brasil Mineral, economista e professora da UFPA, Maria Amélia Enriquez, e participação de Maria Green, do Centro de Tecnologia Mineral -- CETEM, Sérgio Leão, do Tribunal de Contas do Município do estado do Pará (TCM Pará) e Rogério Moreira, Consultor Jurídico da AMIG. 

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A representante do CETEM foi a primeira a falar sobre a pesquisa dos royalties da mineração e sua transparência. Foram R$ 29 bilhões arrecadados pelos municípios entre 2019 e 2021. “Nós fizemos um rastreamento de como os recursos são aplicados pelos principais municípios mineradores e separamos os trinta maiores arrecadadores da CFEM (cerca de 90%). Ficou constatado que a maioria das LOAs (Lei Orçamentária Anual) disponíveis não são transparentes, seja na receita ou na despesa, e o que está destinado de recursos para cada projeto”. A CFEM tem um peso muito grande na receita orçamentária do município e quando é feito esse tipo de pesquisa, há uma dificuldade técnica tanto para o especialista como para o leigo que queira conhecer o assunto. “Nenhum município conseguiu se enquadrar em todos os níveis de transparência de 2019 para cá”. Há uma grande concentração de CFEM em 30 municípios, que aumenta o repasse do ICMS, além de faltar transparência no uso dos recursos. Maria Green disse que a pesquisa sobre transparência teve como objetivo saber como está sendo gasto os recursos da CFEM e como a receita dinamiza o território, com participação da sociedade. “Nós não sabemos se a CFEM está sendo bem usada”. Nos últimos anos, segundo ela, tem sido ampliado o debate de questões legislativas até uma maior participação social relacionados com a CFEM. “Temos que pensar a renda gerada na extração mineral minerais e onde os recursos serão alocados”. 

A seguir Rogério Moreira, da AMIG, disse faltar mecanismos eficientes para que a transparência seja palatável ao acesso público, da sociedade. Ele contestou que houvesse falta de transparência das informações por parte dos municípios. “É como se não estivesse sendo feito o processo indicado pela legislação, e isso não é real. Todo o uso de CFEM que passe pelos procedimentos prévios, são legais e legítimos, pois praticados por aqueles de direito’. Ele acrescentou que se alguém buscar direto no Tribunal de Contas, verá toda a rastreabilidade de onde está indo o recurso público, acrescentando que isso está em processo de evolução “Minas Gerais está na frente, é a versão 2.0 de transparência. O problema talvez seja os mecanismos legais para a transparência por parte dos municípios”. 

O representante da AMIG disse que, primeiro, se deveria olhar para o passado e ver que a Constituição determinou o uso dos 20% em educação e saúde. “Mas isso foi feito? Colhemos bons resultados? Como vamos nos preocupar com as próximas gerações, se ainda estamos muito atrasados pela falta de empatia atual?. O Estado não consegue dar um resultado sem o comprometimento da sociedade. Em Minas, ainda não foi elaborado o Plano Estadual da Mineração (proposta de 1989), então, devemos realizar acordos que tivessem instrumentos capazes de serem cobrados. Caso contrário, é necessário alterar a lei, mas não desrespeitá-la”. 

A moderadora Maria Amélia comentou que a nova lei demorou uma década para ser votada. O foco do acordo de cooperação técnica celebrado parte de duas premissas: melhorar e otimizar a malha fiscalizatória federal e conseguir dar celeridade aos processos, principalmente de pesquisa, para ajudar a ANM a desafogar os passivos de requerimentos. E, por último, o compartilhamento de dados ajudarão os municípios a ter capacidade de planejamento de políticas públicas. A ANM tem informações que as mineradoras oferecem, mas que não é repassado ao ente municipal. 

Sérgio Leão, do TCM Pará, comentou que os municípios mineradores têm situação diferenciada em relação aos demais municípios, devido à possibilidade de geração de riquezas, com distribuição para os munícipes. “Eu vejo a realidade dos municípios e acho que a lei dos royalties precisa ser alterada, pois não é obrigatório, mas é preferencial o uso dos 20% da CFEM. É difícil alterar para aumentar o controle e transparência, pois tudo é misturado nas receitas”. Leão diz que os municípios que recebem CFEM têm que ser mais cobrados, com uma responsabilidade no uso e na decisão do uso do recurso. “É necessário unir todos os atores para realizar uma mudança, caso contrário há pactuações para que se estabeleçam novas formas de relacionamentos”, concluiu Leão. 

“Desafios para fazer simulados de emergência eficientes e efetivos”

Na sequência ocorreu o Painel “Desafios para fazer simulados de emergência eficientes e efetivos”, com a moderação de Francisco Alves, da Brasil Mineral, e os convidados Guilherme Ferrari, da Integratio, Roberto Junio Gomes, analista ambiental da FEAM e Nilson Gonçalves Bigogno, da CBA. 

Guilherme Ferrari foi o primeiro participante a abordar o tema no painel e disse que o simulado precisa fazer parte periodicamente da rotina das empresas e das comunidades, como cultura de prevenção de riscos, e para as pessoas entenderam a importância da conscientização das ações preventivas em uma possível situação de emergência. 

A lei nacional mais atual, que prevê a realização de simulados, é a nº 14.066/2020, mas sem ter uma periodicidade definida. Cada estado vai definir o período dos simulados. Entretanto, em Minas Gerais, por decreto estadual, ficou definida uma periodicidade anual para todas as barragens, onde há uma série de requisitos para elaboração do Plano de Ação de Emergência (PAE). Para a realização dos simulados é obrigatória mobilização dos públicos externos (comunidades) e internos (funcionários) e todos devem estar preparados para o enfrentamento de qualquer problema; realizar simulados em condições desfavoráveis para encarar chuva, lama, o que é mais difícil devido à infraestrutura a ser montada, envolvimento da Defesas Civis dos municípios; Gestão das sirenes – tem que ter um estudo de engenharia para definir a melhor instalação dos equipamentos, reforço na comunicação e no relacionamento com a comunidades; divulgação dos canais de comunicação e obtenção de conhecimento da população da ZAS : aspectos sociais, econômicos e ambientais. 

Na sequência, Nilson Bigogno, da CBA, falou sobre a governança de barragens das duas barragens localizadas em Minas Gerais. A CBA foi muito conservadora no método de construção das estruturas, em etapa única e sem alteamento (rejeitos e água), tem duas ETAs (uma para cada barragem), então, isso nos passa muita segurança. O outro pilar é a disciplina que engloba toda cadeia hierárquica da CBA e as reuniões semanais; o terceiro é a transparência com o público que está no entorno das barragens. “Não se pode subestimar a inteligência das pessoas e é preciso ouví-las e explicar tudo o que querem saber, de forma didática”. Por último, o relacionamento com a comunidade, que exige vários encontros, cultivado durante o ano. “Fazemos 12 testes anuais, fora os simulados, com um planejamento anual para a população ter ciência do que iremos fazer. O importante é não terceirizar o serviço com a comunidade”. Outro ponto importante para a CBA foi a manutenção dos simulados durante a pandemia em parceria com a Defesa Civil e Secretarias de Saúde. “O simulado foi feito com a pessoa que morasse mais longe dos pontos de encontro”. A CBA faz a medição de quantas pessoas participam dos simulados pela presença da comunidade local e efetiva. “Às vezes, as pessoas não comparecem aos simulados por motivos diversos, mas sempre procuramos saber as razões posteriormente”. 

O último participante foi Roberto Gomes, da FEAM, o qual comentou que o Estado de Minas Gerais enfrenta desafios com a nova lei, pois é obrigado a resgatar pessoas e animais, proteção de patrimônios culturais e resguardar o fornecimento de água potável. “Além disso, o Plano de Emergência é vinculado à concessão de licença de operação, o que coloca o Estado em uma situação complicada para aprovar estudo e desenvolvimento de qualquer empreendimento que haja risco. Ao receber esta tarefa na regulamentação, o Estado busca padronizar sobre o que já é conhecido”. Essa regulamentação deveria contemplar todas as barragens de mineração e indústria (rejeitos, água,etc). “O decreto transfere para as secretarias estaduais a percepção de que elas podem regulamentar o processo de aprovação. Para esta anuência, todos os órgãos precisarão estar envolvidos”. 

Para ele, os principais desafios são a consciência e a cultura do risco e o quanto isto é negligenciado no Brasil; o segundo ponto é a dificuldade da comunicação com populações diversas e níveis escolares distintos. Precisamos de profissionais preparados para realizar a comunicação com estas pessoas; e o último ponto é a confiança entre empresa e população a jusante, principalmente depois dos acidentes. A comunidade tem questionado muito mais as mineradoras. “Não pode ser normalizada a falta de confiança entre as partes”. 

A disposição dos rejeitos e as comunidades 

A última sessão do dia teve como tema “Que tipo de Mudanças na disposição de rejeitos as empresas adotaram em função das comunidades?”, moderado por Vânia Andrade, química e membro do Conselho de Administração da ABM, e com a participação de Luiz Henrique Passos Rezende (ANM/MG), Julio Nery, diretor de Sustentabilidade e Assuntos Regulatórios (IBRAM), Yuri Azevedo, gerente de Meio Ambiente da Mineração Usiminas, e Christian Andrade, gerente das Unidades da Zona da Mata da CBA. 

O primeiro a participar foi Julio Nery, do IBRAM, que citou duas coisas das quais a sociedade mais reclama da mineração e o que o setor precisa fazer para o futuro. O primeiro motivo é passar a sensação de segurança para a comunidade que foi afetada após os dois rompimentos de Fundão e Brumadinho, mas a função é trazer essa segurança novamente para a população. O segundo ponto é minimizar os risco ao meio ambiente, pois o setor não pode mais aceitar outro acidente. Outro trabalho é reduzir as pilhas de rejeitos, já que temos exemplos positivos, como a Nexa, em Paracatu, que usa os rejeitos e estéreis para corretivos de solo para a agricultura. 

“Em relação ao futuro, a maior preocupação que eu vejo está relacionada com a viabilização das pilhas de rejeitos desaguados, já que a pilha anda mais lentamente que uma barragem. Temos que fazer formas de disposição mais seguras e recuperar a credibilidade do setor junto à sociedade”. 

Luiz Rezende, da ANM, abordou os quatro acidentes que atendeu desde que entrou na agência – Miraí (2007), Herculano (2014), Bento Rodrigues (2015), Brumadinho (2019). Após todos, adotaram o PAEBM – Plano de Ação de Emergência para Barragens de Mineração que aborda quem deve operar, como fazer e como avaliar e integrar empresas, sociedade civil e comunidades. “A essência da mineração é para quem ela minera”. 

Christian Andrade, da CBA, começou a falar sobre as comunidades na Zona da Mata há 40 anos, onde produz bauxita há 30 anos. “Transparência e relacionamento com comunidades é algo natural e nossa mineração é pontual, superficial, temporária e progressiva. E já estabelecemos mais de 400 contratos de servidão minerária. A nossa operação se mistura à produção agrícola e vice-versa”. 

Na implantação da unidade de Miraí a CBA não tem estéril e trabalha para não ter rejeitos. “Em um trabalho de persistência, em 2015, em parceria com a Haver, pensamos na peneira desagregadora da bauxita e desta forma conseguimos substituir a tecnologia antiga”. Com as questões das barragens, a CBA pensou em uma separação sólido-líquido e chega a uma torta de argila, de onde surge a argila para produção do solo para aplicar no processo de reabilitação ambiental. Desde 2018, a empresa trabalha com tecnossolo para aplicar nessas áreas, para, em 2026, iniciar a primeira aplicação mundial de tecnossolo em processo de fabricação, sem utilização de rejeitos. 

Yuri Azevedo, gerente de meio Ambiente da Mineração Usiminas, trouxe o exemplo recente de conclusão da descaracterização das duas barragens a montante em fevereiro de 2022 e o descomissionamento da barragem a jusante e 100% do processo é de rejeito filtrado. “Explicamos para a comunidade como seria a migração do processo, já que a barragem passa a não existir, mas surge uma grande pilha”. 

A nova tecnologia do rejeito filtrado tem que ser explicado para a comunidade e as empresas tem que saber como entregar essa informação. “Temos a sorte de estar em uma comunidade com perfil minerário. A nova tecnologia traz um ganho na recirculação de água e qual seria o ganho do processo, tudo precisa ser nítido para a sociedade. Quando não se utiliza rejeitos é uma grande notícia para todos”. 


A 7ª edição do Mineração&XComunidades é uma realização da revista Brasil Mineral e tem patrocínio Ouro da Kinross, CBA, Appian Capital Brazil, BAMIN e ERO Brasil, patrocínio Prata da Largo, Bemisa, Anglo American e Hochschild e patrocínio Bronze, da Buritirama Mineração, Galvani, Aura e Potássio do Brasil, além da coordenação técnica e apoio da Integratio.