O que é determinante para o sucesso de um IPO de mineradora no Brasil?

14/03/2024
Veja a opinião de Rodrigo Barbosa, CEO da Aura Minerals

 

Quais são os fatores determinantes para que uma empresa de mineração tenha sucesso na listagem de seus títulos na bolsa brasileira, a B3? Para Rodrigo Barbosa, CEO da Aura Minerals, primeira mineradora de ouro a fazer um bem-sucedido IPO na B3, um dos fatores decisivos é a empresa estar gerando caixa e poder distribuir dividendos para quem aposta em seus papéis. Foi isso o que pesou, no caso da Aura, que fez o IPO em um período delicado, quando o mundo estava às voltas com a pandemia Covid-19.

Ele narra que, na época em que a empresa – que já era listada na bolsa de Toronto, Canadá -- decidiu partir para a dupla listagem, a fim de obter funding para custear seus projetos de crescimento, o mercado canadense, onde a grande maioria das junior mining companies e mineradoras de médio porte fazem captação de recursos, estava vivendo uma fase de escassez de capitais para a mineração. “Já não se via em Toronto um mercado pujante para a mineração como ocorreu na primeira década dos anos 2000, pois boa parte dos recursos estavam sendo investidos em Fintechs, Cannabis e várias outras indústrias. Nós, da Aura, vínhamos obtendo sucesso, através de um turn-around, e queríamos recontar essa história através de um IPO”, diz o CEO. Na ocasião, a Aura chegou a pensar nos mercados de Nova Iorque e Londres, como possibilidades. Porém, constatou que ainda era uma empresa pequena para esses mercados. E decidiu se voltar para o Brasil. “Naquela época, o Brasil vinha numa decrescente de juros, que estavam reduzidos, e via-se uma migração muito forte do mercado de capitais de dívida para o mercado de capitais de equity, com novos fundos sendo formados, captando e procurando alternativas de investimento no Brasil, onde estavam ocorrendo vários IPOs, mas todos em setores (varejo e outros) que já vinham levantando capital. Percebemos, então, que havia no Brasil bastante capital migrando para Equity e uma escassez de empresas com histórias diferentes na bolsa. Não havia ninguém, como nós nos apresentamos, com um fator verdadeiramente anticíclico. Portanto, quem quisesse estar protegido em dólar e ainda mais acima do dólar (o ouro) poderia ter como uma alternativa investir na Aura. Além disso, temos o DNA brasileiro. Com base nesses motivos, julgamos que teríamos sucesso. Tivemos conversas com alguns fundos de investimento, que demonstraram interesse e inclusive ancoraram o nosso Deal”, diz Barbosa.

Ele acrescenta que, para que o IPO desse certo, a empresa teve que fazer um “investor education”, porque a mineração de ouro, para o brasileiro, é algo novo como investimento. O investidor está mais acostumado a investir no ouro como ativo, mas não na mineração do metal. Nesse processo, a empresa teve a seu favor o fato de ter um track-record de geração de caixa e de contar com projetos de crescimento. A operação de Aranzazu, no México, havia sido retomada e havia outros projetos no pipeline, no Brasil. “O fato de estarmos gerando caixa e pagando dividendos foi muito importante para dar o conforto necessário para o investidor entrar num segmento diferente, que é a mineração de ouro. Não fosse esse track-record de geração de caixa e pagamento de dividendos, os investidores não estariam preparados para entrar”.

Uma das vantagens dos projetos de ouro, segundo Rodrigo Barbosa, é que, por não demandarem investimentos em logística, além de custar menos podem ser implantados mais rapidamente. No caso da Aura, seu crescimento se baseia em projetos de simples execução (operações de mina a céu aberto, processamento por CIL -- Carbon In Leach e escala média) e em um time e uma cultura de gestão que tomam decisão rápido, têm agilidade, compromisso de entrega. “Essa combinação permitiu que fizéssemos o projeto Almas em 16 meses e o ramp up em cinco meses, colocando novas referências para a indústria. Foi primeiro projeto que fizemos depois do IPO”, diz o executivo.

Outro ponto importante, que ajudou no sucesso da Aura foi o fato de já estar listada na bolsa de Toronto, adotar os mais altos padrões de governança corporativa e se submeter à 43.101, que é a norma canadense para certificação de recursos e reservas. “Então, para quem tinha dúvidas de como são certificados os recursos e reservas, já existia ali um processo muito bem definido e fiscalizado pelas autoridades canadenses para que se pudesse relatar aqueles recursos e reservas. Foi essa combinação de fatores que acabou contribuindo para que tivéssemos sucesso no IPO”, observa o CEO.

Indagado sobre os custos de listagem no Brasil, ele disse que não são muito diferentes daqueles praticados em Toronto. “É claro que aumenta o custo por estarmos listados nos dois países e no Brasil fomos para um nível de listagem mais alto, os BDRs (Brazilian Depositary Receipts), aderindo aos mais altos padrões da CVM (Comissão de Valores Mobiliários), que nos obriga a ter relatórios em português, publicações com versão em português e inglês, Conference-Cals bilíngues. Também somos obrigados a ter auditor presente no Brasil e diretor estatutário local, para assinar documentos. Portanto, há todo um arcabouço regulatório no Brasil que acaba aumentando um pouco os custos”.

Investimento incentivado para mineração

Rodrigo Barbosa considera que é muito importante para o Brasil, se quiser desenvolver a mineração, criar mecanismos que permitam viabilizar fundos em melhores condições. “Na década dos anos 2000, o mercado canadense -- e até o australiano -- estava muito pujante para investimentos em mineração e muito desse capital foi parar no Brasil. Muitas empresas importantes de escala global investiram no País. E esses recursos, que eram acessados principalmente no Canadá, a partir de 2013/2014/2015, minguaram. Então, se o Brasil quer que esse setor se desenvolva, precisa encontrar soluções alternativas para não depender excessivamente de capital externo. Viabilizar esse funding localmente é um fator-chave para que o setor possa se desenvolver ao longo dos próximos dez anos”, opina.  

Sobre o apetite do investidor brasileiro para ativos de mineração, Barbosa afirma que ainda demanda um tempo, até que haja um amadurecimento. Ele lembra que até dez anos atrás, o mercado de capitais no Brasil pouco captava para mineração, com exceção da Vale e grandes mineradoras de ferro. “O Brasil tinha quase nada, mas começam a entrar empresas mineradoras que geram caixa (Aura Minerals, CBA, Sigma) e permitem que os investidores comecem a entender mais sobre a mineração e a questão da exploração mineral. Porém ainda estamos na primeira fase, em que os investidores não conhecem tanto mas têm o conforto da geração de caixa em paralelo. A Sigma foi outra empresa já listada com sucesso lá fora e que tinha um plano de crescimento delineado. Não era uma Exploration Company”, diz Barbosa, acrescentando que a próxima fase será a das companhias que ainda estão na fase de exploração. “Mas acho que ainda está um pouco longe disso. O mercado precisa experimentar mais essa mineração com geração de caixa. E aqui falo no mercado de Equity, com empresas listadas, para lá na frente começar a experimentar mais a questão da exploração. O investimento na fase de exploração vai acontecer, porém vai estar mais no âmbito privado, de sócios de private equity, mas não de empresas listadas. Pelo menos nos próximos cinco anos”.

Com relação aos fundos de investimento, o CEO da Aura diz que já se percebe uma “mudança de humor”, lembrando que os últimos dez anos foram marcados por escassez de capital para mineração. “As empresas pararam de investir, de fazer M&A, de investir em exploração, as ações acabaram caindo bastante, e agora veio toda a questão do ESG, estabelecendo que apenas as empresas que têm altos padrões acabam conseguindo captar. As que não têm vão ficando pelo caminho. Também teve a discussão sobre onde a mineração se encaixa no ESG. Houve bancos, como o BNP Paribas, que parou de financiar para a mineração, por conta do ESG. Mas por outro lado, é tudo uma questão de entendimento. A mineração tem, sim, impacto na natureza, mas o problema pode ser minimizado e depois se recompõe toda a natureza que foi afetada. Mas durante o processo se acaba interferindo e isso tem um impacto negativo. Por outro lado, já existe o entendimento de que não há, por exemplo, migração da matriz energética do carbono para o elétrico se não houver o cobre e uma série de outros elementos. Não há produtos de altíssima tecnologia sem ouro. Não existe migração para baterias elétricas sem lítio. Então começa o entendimento de que sem a mineração não há alguns produtos importantes, porque a humanidade continua se desenvolvendo e inovando. Então, vemos o humor mudando. Mas, à exceção talvez do lítio e outros minérios muito ligados a baterias, as empresas de mineração hoje estão com valuations muito deprimidos. E ao mesmo tempo as commodities estão com preço bom. O ouro está perto da máxima. O cobre, embora não esteja perto da máxima, está num valor que permite geração de caixa. É a primeira vez que vejo um ambiente em que se tem commodities a preços atrativos e os valuations das empresas relativamente deprimidos. Portanto, acho que é uma boa oportunidade para novos investidores olharem com carinho, porque é um setor necessário. Sem investimento ao longo de décadas, não há como crescer o supply nos próximos três, cinco, ou dez anos. A demanda está vindo com força, os preços tendem a ficar mais elásticos e gradualmente entendo que as empresas vão recompor seus valuations, que hoje estão muito deprimidos”, conclui Rodrigo Barbosa.

Por Francisco Alves

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